domingo, 7 de abril de 2013




Nos fins de semana chuvosos, tenho como hábito reler os livros de minha modesta biblioteca e nas minhas releituras tive a chance de redescobrir a obra de Rubem Fonseca. Acho fundamental conhecer a literatura de um cara  cada vez mais atual mesmo com algumas mudanças fundamentais no cenário urbano carioca e brasileiro. A obra de Rubem Fonseca não se renovou, mas as pessoas mudaram. Entretanto, a violência continua inalterável. A obra de Rubem Fonseca aborda o universo de personagens que vivem no seu cotidiano experiências-limites que beiram o pesadelo. Mas não é pesadelo, é realidade, que está perto de todos nós.

Rubem Fonseca rejeita, propositalmente, a dialética e adota o lugar-comum da desigualdade social como a responsável pela violência cotidiana. Mas isso é apenas um recurso - não existe nada mais clichê do que a própria violência. Nas histórias de Rubem Fonseca, a cidade é uma selva hostil. Na verdade, é a crueldade do acaso que detona a violência dos personagens do autor. Não existe sujeito sem violência, o vazio da brutalidade pura e silmples.

É num mundo desprovido de sutilezas e sufocado por insatisfações de todo o tipo que Rubem Fonseca revela a miséria ética e emocional dos brasileiros. Na obra do escritor há assassinatos brutais, mas também patéticos, que oscilam entre o humor e a tragédia.

O erotismo e a morte estão sempre presentes na escrita sintética, cortante, repleta de termos chulos, deste ex-delegado de polícia. Não há consciência ideológica no realismo cru de personagens que veem na crueldade a única forma de lucidez.

Rubem Fonseca se volta para as misérias do cotidiano, que geram, inclusive, o discurso moralista e fascista das Igrejas neopentecostais, para explicar o comportamento social do indivíduo.

A obra de Rubem Fonseca inclui o dado inumano no comportamento dos sujeitos. E conclui que a lei é algo que vem atender apenas a certos interesses, não existe  lei que possa atender a todos.

A violência está presente em todas as instâncias e esferas da vida social e, se podemos aceitá-la como fato, fica mais fácil suportar o trágico. Temos de conviver com a violência e tentar entendê-la. A violência é um fenômeno inconcludente, mas que deve ser fortemente questionado e problematizado.





Neste texto, nada burilado, aproveito para fazer um desabafo tão inútil quanto um grafite na parede: há algo de muito errado com a sociedade brasileira. O acidente no viaduto do Rio que matou sete pessoas, deixando, inclusive, mais quatro gravemente feridas, não foi um acidente, foi um crime, causado pelo péssimo comportamento da própria sociedade, no caso, do motorista - com duas passagens pela polícia -  e de um passageiro, segundo o depoimento de testemunhas, um playboy esquentidinho - que também tem ficha suja na polícia - que resolveu agredir o motorista displicente. Mas este não é um caso isolado, é flagrante o comportamento cada vez mais hostil das pessoas, de todos os sexos, classes e idades, na rua, no trânsito, nas escolas, enfim, em todos os lugares. Canso de ver as atitudes antipáticas, estúpidas das pessoas nos transportes públicos que eu uso - metrô, ônibus, vans, barcas. É um martírio, isso sem falar do trânsito, atrevessar uma rua é uma preocupação constante. Nas ruas, pessoas grosseiras, de cara feia, cheias de empáfias e imposturas. E o acidente com o microonibus é fruto desta incivilidade, claro que há outros motivos indiretos, como a falta de fiscalização dos ônibus, por exemplo, mas o motivo maior foi a truculência de todos nós. O mesmo eu posso dizer de outro filhinho de papai, pois é, mais um, que atropela um trabalhador, arranca-lhe o braço e foge, jogando o membro da vítima na vala, coisa que nunca vi nem nos filmes de terror mais trash. Tem ainda o incêndio na boate do Rio Grande do Sul causada por um rojão - jogar fogos num ambiente fechado??? O triste é saber que estas tragédias não repercutem da meneira que se devia no seio da sociedade, com certeza anestesiada com sua própria torpeza e insensibilidade. Hoje, completa dois anos um dos acontecimentos mais tristes da história do Rio de Janeiro: o massacre promovido por um jovem, cheio de ódio, não importa saber se ele era louco ou não, que vitimou dezenas de crianças de uma escola secundária de Realengo. A dor, após dois anos, continua. Já a tragédia de São Paulo, em que um estudante universitário, pois é, outro, chacinou espectadores de uma sessão de cinema, já foi esquecida faz tempo... Esses casos, curiosamente, não acontecem nem em países "subdesenvolvidos" e extremamente violentos como Venezuela, África do Sul ou Guatemala. Nossa brutalidade copia até tragédias de outros países, como EUA. Mas, no fundo, não é imitação, é simplesmente violência em seu estado mais bruto, conectada com aquilo que há de pior em qualquer lugar do planeta. Ainda vemos a tragédia, a violência, o crime como um espetáculo televisivo, midiático, de ficção, quer dizer, o que acontece é com os outros, personagens. Não nos vemos mais no espelho, não queremos enxergar as nossas psicoses, nossa frustrações e ressentimentos. O inferno são os outros? Duvido, o inferno somos nós e nosso comportamento inaceitável. Sempre vemos a tragédia como mais um episódio de uma série de TV  estilo Dexter, que todos adoram. Parece que sempre esperamos pelo próximo espetáculo regado a sangue e lágrimas e sempre nos esquecendo que os personagens da tragédia somos nós ou, pelo menos, o nosso espelho distorcido pela maldade e insensibilidade. Estou magoado com a pouca repercussão do acidente com o microonibus, nas ruas, entre a sociedade, não a mídia, que adora ver sangue como espetáculo. Não vi, não ouvi pessoas dizendo nada ou lamentando nada sobre o episódio nos lugares que frequento, que são muitos. Não vi grande repercussão nas redes sociais, se bem que não procuro, por discrição, saber muito o que as pessoas postam em seus perfis, mas, notícias de grande gravidade, antigamente, pelo menos, repercutiam com grande intensidade. Mas rede social... Aqui, é assim, vem uma tragédia, vai outra, como um BBB qualquer... Hoje, não é cool por aqui chorar pela dor alheia, pois a dor, é uma coisa dos outros e "os outros são os outros e só" (?)... Pra que se preocupar? Repito: a sociedade brasileira está profundamente doente. Mas quem se importa?