Neste texto, nada burilado, aproveito para
fazer um desabafo tão inútil quanto um grafite na parede: há algo de
muito errado com a sociedade brasileira. O acidente no viaduto do Rio
que matou sete pessoas, deixando, inclusive, mais quatro gravemente
feridas, não foi um acidente, foi um crime, causado pelo péssimo
comportamento da própria sociedade, no caso, do motorista - com duas
passagens pela polícia - e de um passageiro, segundo o depoimento de
testemunhas, um playboy esquentidinho - que também tem ficha suja na
polícia - que resolveu agredir o motorista displicente. Mas este não é
um caso isolado, é flagrante o comportamento cada vez mais hostil das
pessoas, de todos os sexos, classes e idades, na rua, no trânsito, nas
escolas, enfim, em todos os lugares. Canso de ver as atitudes
antipáticas, estúpidas das pessoas nos transportes públicos que eu uso -
metrô, ônibus, vans, barcas. É um martírio, isso sem falar do trânsito,
atrevessar uma rua é uma preocupação constante. Nas ruas, pessoas
grosseiras, de cara feia, cheias de empáfias e imposturas. E o acidente
com o microonibus é fruto desta incivilidade, claro que há outros
motivos indiretos, como a falta de fiscalização dos ônibus, por exemplo,
mas o motivo maior foi a truculência de todos nós. O mesmo eu posso
dizer de outro filhinho de papai, pois é, mais um, que atropela um
trabalhador, arranca-lhe o braço e foge, jogando o membro da vítima na
vala, coisa que nunca vi nem nos filmes de terror mais trash. Tem ainda o
incêndio na boate do Rio Grande do Sul causada por um rojão - jogar
fogos num ambiente fechado??? O triste é saber que estas tragédias não
repercutem da meneira que se devia no seio da sociedade, com certeza
anestesiada com sua própria torpeza e insensibilidade. Hoje, completa
dois anos um dos acontecimentos mais tristes da história do Rio de
Janeiro: o massacre promovido por um jovem, cheio de ódio, não importa
saber se ele era louco ou não, que vitimou dezenas de crianças de uma
escola secundária de Realengo. A dor, após dois anos, continua. Já a
tragédia de São Paulo, em que um estudante universitário, pois é, outro,
chacinou espectadores de uma sessão de cinema, já foi esquecida faz
tempo... Esses casos, curiosamente, não acontecem nem em países
"subdesenvolvidos" e extremamente violentos como Venezuela, África do
Sul ou Guatemala. Nossa brutalidade copia até tragédias de outros
países, como EUA. Mas, no fundo, não é imitação, é simplesmente
violência em seu estado mais bruto, conectada com aquilo que há de pior
em qualquer lugar do planeta. Ainda vemos a tragédia, a violência, o
crime como um espetáculo televisivo, midiático, de ficção, quer dizer, o
que acontece é com os outros, personagens. Não nos vemos mais no
espelho, não queremos enxergar as nossas psicoses, nossa frustrações e
ressentimentos. O inferno são os outros? Duvido, o inferno somos nós e
nosso comportamento inaceitável. Sempre vemos a tragédia como mais um
episódio de uma série de TV estilo Dexter, que todos adoram. Parece que
sempre esperamos pelo próximo espetáculo regado a sangue e lágrimas e
sempre nos esquecendo que os personagens da tragédia somos nós ou, pelo
menos, o nosso espelho distorcido pela maldade e insensibilidade. Estou
magoado com a pouca repercussão do acidente com o microonibus, nas ruas,
entre a sociedade, não a mídia, que adora ver sangue como espetáculo.
Não vi, não ouvi pessoas dizendo nada ou lamentando nada sobre o
episódio nos lugares que frequento, que são muitos. Não vi grande
repercussão nas redes sociais, se bem que não procuro, por discrição,
saber muito o que as pessoas postam em seus perfis, mas, notícias de
grande gravidade, antigamente, pelo menos, repercutiam com grande
intensidade. Mas rede social... Aqui, é assim, vem uma tragédia, vai
outra, como um BBB qualquer... Hoje, não é cool por aqui chorar pela dor
alheia, pois a dor, é uma coisa dos outros e "os outros são os outros e
só" (?)... Pra que se preocupar? Repito: a sociedade brasileira está
profundamente doente. Mas quem se importa?
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